Terapia tradicional, Coaching e Aconselhamento Biográfico: qual a diferença?
Por Silvio Ignacio
“Nada lhe posso dar que já não exista em você mesmo. Não posso abrir-lhe outro mundo de imagens, além daquele que há em sua própria alma. Nada lhe posso dar a não ser a oportunidade, o impulso, a chave. Eu o ajudarei a tornar visível o seu próprio mundo, e isso é tudo.” Hermann Hesse
Ao longo da minha carreira, optei por trabalhar com diferentes tipos de apoio ao desenvolvimento, dentro do espectro de possibilidades que emergiram e ocuparam seu espaço, ao longo dos anos. Talvez pelo tempo de uma longa carreira, ou de uma qualidade mercurial que me move com energia e interesse contínuo todos os dias, atuo profissionalmente como terapeuta, coach e Aconselhador Biográfico.
Considero importante, assim como recomendo a qualquer profissional da área de desenvolvimento, estar atento ao que o mundo pede, buscar e nutrir-se de um aprendizado contínuo para manter-se apto a atender a quem nos procura.
Tais modalidades de atendimento vêm atender as diferentes compreensões e necessidades humanas, face a um mundo cada vez mais desafiador e diverso. Ser profissional também significa saber discernir dentro das próprias competências quais os próprios limites e potenciais, e o quanto se está preparado para lidar com a demanda que chega.
Longe de qualquer tentativa de estabelecer hierarquias ou dar receitas, busco trazer uma contribuição e esclarecimentos para uma pergunta que tem surgido com frequência: qual a diferença entre estas três áreas de atuação profissional?
Segundo Carl Jung, “O encontro de duas personalidades assemelha-se ao contato de duas substâncias químicas: se alguma reação ocorre, ambos sofrem uma transformação”. Trago esta afirmação como uma verdade em meu coração. Prefiro primordialmente olhar para aquilo que une as três abordagens: as referidas modalidades de apoio ao desenvolvimento trazem em si a possibilidade de inspirar solução para algo que esteja sendo impeditivo a um fluxo de vida desejável do cliente ou paciente, e o profissional que se coloca a serviço, deve ter uma sólida formação; o cliente traz em si todos os recursos, criatividade e possibilidades para alcançar o que necessita e sua posição é no centro, como protagonista das mudanças que virá conquistar.
Colocada a necessidade trazida por aquele que busca apoio(questões pessoais ou profissionais), novos elementos surgem e, frente a um mapa com os tipos de apoio disponíveis, pode-se ponderar o melhor caminho a percorrer, avaliando pontos entre a ação profissional prescritiva e não prescritiva.
A Psicologia, enquanto ciência e profissão, focaliza o comportamento de indivíduos e grupos e como fim último busca a saúde da sociedade em termos de comportamento e processos mentais adequados à vida moderna. O profissional desta área, o psicólogo ou terapeuta, pode, então, ser classificado como cientista social ou comportamental e tem uma grande contribuição a dar para compreensão da saúde mental de indivíduos e grupos, lidando, inclusive, com patologias. Aquele que busca um processo terapêutico tradicional é tratado como paciente e, ao apresentar suas dores e anseios, pode até ser diagnosticado. Então, inicia-se um processo contínuo abordando as queixas e desafios vividos.
Aquele que busca um processo de coaching é tratado como performer ou coachee. Este, é convidado a performar, empreender esforços de uma maneira mais focada, na busca de atingir metas que ele mesmo elegeu, ou que podem vir das necessidades da organização onde atua. Existe um número acordado de sessões e as metas para o processo, a priori, contratadas no início e checadas em diferentes momentos. Estas podem ser metas profissionais, ou mesmo para condução da vida como um todo. Todas as dimensões da vida podem ser revisitadas, porém com um objetivo específico e ocupa-se mais com o futuro do que com o passado. O performer é quem assume toda responsabilidade do seu desenvolvimento e vivência um ciclo de reflexões-aprendizagem planejamento-ação. A agenda é totalmente do performer, o coach não dá conselhos nem direcionamentos, trabalha com perguntas apoiando o performer para que ele se desenvolva, para o aumento da consciência (das competências, motivos, fatores limitantes e potencial). Isto fica evidente na mudança comportamental e nos resultados atingidos. É um encontro aberto e autêntico (o principal instrumento do coach é ele mesmo e sua experiência), uma parceria de aprendizado entre coach e coachee.
O Aconselhamento Biográfico, é um trabalho de fundo higiênico, salutogênico, e atua na base daquilo que cada um de nós tem de mais importante, o sentido da própria existência. O olhar diferencial aqui é que, num processo de aconselhamento biográfico, o cliente, assim como na pintura de um quadro, é convidado a construir seu panorama biográfico, o que significa se deparar com a vida como um todo. Com uma metodologia e estrutura muito bem definidas, há um número de sessões proporcional, estimadas à idade de cada cliente, e aquele que chega em busca deste processo, anseia lidar com questões anímicas, que emergem pelas chamadas crises de desenvolvimento humano. Muitas vezes as pessoas conhecem biografias de personalidades e não a própria história.
Ao invés de focarmos apenas na questão trazida, na biografia atravessamos seus altos e baixos: paisagens ensolaradas, outras mais escuras, e resgatam-se os encontros de pessoas relevantes no caminho. Toda essa paisagem de vida, revela que tudo está num contexto maior, e dentro de leis maiores que determinam certos ritmos na nossa biografia. É possível compreender o todo, a síntese da própria vida e o significado maior de um impulso.
No trabalho biográfico, partimos do presente, para então caminharmos do passado até ali novamente. Só então, nos direcionamos ao futuro, não nos deixando simplesmente nos “levar” pela vida, mas, com o passado devidamente integrado, definir os passos a dar, com perspectivas mais coerentes e amplas.
O Aconselhamento Biográfico é um trabalho de base, que pode ser vivenciado individualmente ou em grupo por todos aqueles que buscam o autodesenvolvimento transcendendo o autoconhecimento. Além de se correlacionar e integrar a outras áreas de conhecimento, como a medicina e a pedagogia, depois do processo biográfico o cliente pode ter mais clareza dos pontos onde suas angústias surgem e de que ajuda terapêutica eventualmente precisa. Ou então, por sentir tanta convicção nos passos a dar em direção ao futuro, pode buscar o acompanhamento de um coach para apoiá-lo em suas realizações.
Mais importante do que distinguir as diferenças entre os três processos é perceber como estes preciosos caminhos dialogam entre si.
Silvio Ignacio
Terapeuta, Coach e Aconselhador Biográfico
