Há muitos anos brinco com o nome da minha profissão. Explico.
Sendo um trabalho relativamente novo, este ofício teve seu início ao redor de 1993 com a médica antroposófica Gudrun Burkhard, é muito comum as pessoas pedirem para que eu repita o nome do trabalho e perguntem na sequência: mas que tipo de conselho você dá?
É nesse momento que a mescla entre brincadeira e conversa séria acontece. Eu adoraria ser remunerada em meus atendimentos para dar conselhos, mas isso não acontece. A profissão de aconselhadora biográfica não dá conselhos. E a brincadeira, para por aqui.
Assumo que é um prazer explicar para amigos, clientes ou pessoas curiosas sobre o assunto. O tipo de trabalho que assumi como sendo parte da minha expressão no mundo. Sim, parte, pois além de profissional também sou mãe, interculturalista, amiga, namorada, leitora, escritora, cozinheira, filha cuidadora, voluntária… Desempenhamos mais de um papel ao longo da nossa vida, cada um deles com suas particularidades, belezas e desafios.
O primeiro desafio da Aconselhadora Biográfica é vivenciar a travessia dos quatro anos de formação e aprender seus conteúdos; criar, executar e avaliar um projeto biográfico; estudar em detalhes e sob a ótica da Antroposofia a biografia de alguém já falecido – no meu caso, fui escolhida por Clarice Lispector para realizar essa tarefa -; realizar atendimentos biográficos supervisionados como estágio e escrever a sua própria biografia como um conto de fadas. Cumprindo-se todas essas exigências, somos certificados como Aconselhadores Biográficos. Aposto que você não imaginava que passávamos por tudo isso!
Uso a palavra desafio, pois é um processo pelo qual escolhi passar e que envolveu a disponibilidade de tempo, recursos financeiros, cuidados à distância de dois filhos em idade escolar, um peludo de quatro patas que sentia mais a minha falta que os filhos, custo com hospedagem, deslocamento até o local… sim, fazer uma formação – qualquer que seja – é um processo de superação. E eu nem mencionei os desafios emocionais pelos quais passamos durante essa formação e o esforço de autorresponsabilidade e propósito que é realizar todas as tarefas para ter o certificado em mãos. Isso fica para outro texto.
O segundo desafio passa a ser brincadeira de criança diante do que foi a profunda, rica e desafiadora experiência da formação. Explicar o que é o meu trabalho, também é desafiador.
Vou começar dizendo o que não é o aconselhamento biográfico. Não é um processo psicoteraupêtico, nem de coaching. É um processo de ordenação cronológica da biografia de uma pessoa, tendo como base a Antroposofia e as leis que regem o desenvolvimento humano.
É aqui que a conversa esquenta e as perguntas pulam, como pipocas estourando na panela. O que é Antroposofia? Leis biográficas, mas isso se aplica para qualquer pessoa no mundo? Ordenar a minha biografia por datas para que se eu já conheço a minha história? E onde fica o aconselhamento que não dá conselho?
Aconselhamento biográfico é a tradução de Biographic Counselling, termo usado no exterior para identificar este trabalho, mas como estamos falando de algo que tem seu lado espiritual, afinal a Antroposofia é uma ciência-espiritual, as palavras representam muito mais que o seu significado literal. Com isso, expandimos a nossa compreensão sobre o processo e sobre nós mesmos. Vou deixar a pesquisa teórica a seu critério, leitora, leitor. Vou compartilhar o que carrego no coração relacionado a este termo.
Biografia é para mim a palavra mais importante. A grafia da vida sempre me interessou, seja pelas histórias que biógrafos deixaram registradas em um número expressivo de livros – a primeira que tocou meu coração foi a de Gandhi, quando eu tinha 21 anos – seja por reconhecer que é algo singular, único. Ainda que nos reconheçamos nas biografias dos outros, a nossa trajetória não tem réplica. Pode até inspirar alguém, mas jamais poderá ser reproduzida por outra pessoa além de nós mesmos.
Esse trabalho auxilia na ordenação cronológica da vivência de quem procura uma Aconselhadora Biográfica para que esta pessoa possa reconhecer e identificar não só os aprendizados que seus desafios pessoais proporcionaram, mas se deparar com a força transformadora que o encadeamento de fatos, eventos, encontros e desencontros, alegrias e tristezas, doenças e curas podem oferecer a partir do momento que nos oferecemos essa oportunidade: fazer uma retrospectiva biográfica.
Ordenar, desde o início de nossa vida antes mesmo de termos nascido (ancestralidade, encontro dos pais, período de gestação) toda a vivência que tivemos até o momento atual, traz sentido. Fortalece. Prepara para os próximos passos. Desperta para novas potencialidades. Faz com que reconheçamos que não viemos aqui a passeio e que a paisagem dessa nossa trajetória, tem as cores que nós mesmos escolhemos. Isso é libertador!
E a aconselhadora, onde fica nisso tudo? Fica ao lado. Acompanha. Ampara. Faz perguntas. Oferece a visão da atuação das leis biográficas em cada etapa de sete anos da vida. Auxilia a pessoa a compreender como o seu temperamento, o seu caráter, as influências que recebeu da vida e as escolhas que fez fizeram com que ela chegasse até onde está. E, a partir dessa compreensão, fazer novas escolhas em relação aos caminhos que deseja percorrer.
E, algo que me toca de maneira particular, está relacionado ao apóstolo Paulo e a sua descrição do termo aconselhamento em Cartas aos Romanos, quando relaciona os sete dons espirituais e, o quarto deles, é o aconselhamento, sendo ele a maneira da viabilizar, acompanhar e estimular a caminhada procurando estabelecer uma linha de coerência com a prática de Jesus.
Estar ao lado de alguém que deseja se conhecer mais profundamente, aprender com seus erros, reconhecer suas qualidades, transformar suas dores em novos caminhos, olhar de frente para suas sombras é algo que se alinha com meu propósito de vida.
Ter a capacidade, assim como meus colegas de ofício, de oferecer as minhas perguntas, a companhia nessa caminhada, o acolhimento necessário – e de vez em quando um escalda-pés e um chá de camomila, que ninguém é de ferro – para quem me procura, muito me honra.
Presidente da Associação Biográfica 2021-2023/2019-2021,
Aconselhadora Biográfica, Interculturalista, Coach,
Escritora e Voluntária para Refugiados.
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